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ARTIGOS

O Regionalismo Africano: Discussões Introdutórias
Clarissa Ribeiro
Foto de Ueslei Marcelino/ Reuters. Disponível em: http://assets0.exame.abril.com.br/assets/images/2016/4/602947/size_810_16_9_dilma-e-almagro.jpg

foto da página de facebook da União Africana

As dinâmicas de integração regional no continente africano são ainda muito pouco discutidas no Brasil. Com raízes históricas que remetem a arranjos coloniais, o cenário que se apresenta do outro lado do Atlântico mostra-se complexo e inspira discussões acerca do próprio conceito de “região”.


Como compreender o funcionamento de iniciativas de cooperação e integração regional em um território tão vasto e culturalmente diverso como a África? Formado por 54 países, com grande variedade de idiomas, dialetos, tradições e identidades, o espaço geográfico africano começou a ser integrado por iniciativa e influência de suas antigas metrópoles. Assim, por exemplo, o processo de integração econômico mais antigo do mundo, ainda em vigência, foi criado em 1910, a União Aduaneira da África Austral, e renovado em 1969- a partir da independência de Botsuana, África do Sul, Suazilândia, Lesoto e Namíbia (agregada em 1990).


Alguns territórios, como os que pertenciam a África Ocidental Francesa  e  a Áfria Equatorial Francesa chegaram, inclusive, a conformar federações com moeda própria, o que estabeleceu bases para a conformação, após a descolonização, de duas uniões monetárias independentes que têm o Franco CFA(1) como moeda: a União Econômica e Monetária do Oeste Africano (UEMOA), e a Comunidade Econômica e Monetária da África Central (CEMAC).


Os exemplos citados não exaurem, de maneira nenhuma, os processos regionais vigentes na África, mas servem para perceber a influência da colonização na aproximação entre as nações. Ainda, a presença das metrópoles não pode ser considerada como único fator de impulsão do regionalismo: em contrapartida a esses movimentos, no pós-Segunda Guerra, o ideal do “Pan-Africanismo” foi de essencial importância, uma vez que pregava a construção de uma identidade continental em contraposição ao colonialismo.


É seguindo este impulso que se cria, em 1963, a Organização da Unidade Africana (OUA), que em 2002 passou a se chamar União Africana (UA), o mais abrangente dentre os processos regionais do continente. De fato, a União Africana, que ambiciosamente buscava seguir, em grande medida, o modelo de integração proposto pela União Europeia, está composta por 53 países do continente, com exceção apenas do Marrocos, que deixou o bloco em protesto após o aceite do Saara Ocidental como membro, em 1984 (2).


Além das dinâmicas coloniais e continentalistas, a região africana vem sendo interpretada de diversas formas. A ONU, durante os anos 1960, criou a Comissão Econômica das Nações Unidas para a África (UNECA), que propôs a divisão do continente em cinco regiões: Norte, Sul, Leste, Oeste e Central, de forma a promover o desenvolvimento dos países. Já alguns posicionamentos da Academia, por sua vez, afirmam a existência de duas lógicas no continente: uma do Norte, também chamado de “África branca”, composta pelos países árabes; e, geograficamente separada pelo deserto, estaria a Subsaariana, ou a “África Negra”. As várias divisões normalmente são acompanhadas de processos regionais que as seguem e, que muitas vezes, no entanto, não levam em consideração as dinâmicas pré-existentes, competindo diretamente com as propostas de regionalismo em vigência.


O presente texto tinha por objetivo introduzir o debate acerca do regionalismo e a formação de uma região através da experiência africana. Não se pode dizer que os fatores aqui expostos são os únicos de influência para a proliferação de instituições regionais, principalmente levando-se em consideração o contexto em que os processos africanos se desenvolvem, permeado por conflitos territoriais e a busca pela segurança, avanços e retrocessos democráticos na política doméstica, o debate acerca dos direitos humanos, e outras situações, além do grande número de mecanismos regionais existentes e suas particularidades.


No entanto, o debate sobre a construção do espaço geográfico faz-se importante para a compreensão da influência do conceito de “região” na conformação de mecanismos de cooperação e integração: com diversos entendimentos, surgem múltiplos processos entre as nações. Assim, as instituições regionais existentes na África atualmente são também o resultado da tensão entre os processos continentais, os coloniais e os regionais, transformando as conexões entre os países em um emaranhado de organizações em situação de sobreposição.

 

 

 

 

 

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Notas

 

(1) CFA é uma sigla para Comunidades Financeiras da África. Apesar de os dois blocos regionais compartilharem a herança do Franco como moeda, existe uma subdivisão: a UEMOA utiliza o Franco CFA (XOF) e a CEMAC o (XAF). O uso das siglas adjacentes serve ao propósito de distinguir as moedas pois, embora tenham o mesmo nome o mesmo valor, não são intercambiáveis ou equivalentes (Cf. Saidane Dhafer, Ezo’O Veronick, “Mondialisation en Afrique : véritable intégration ou simple vue de l’esprit ?”, Techniques Financières et Développement 1/2015 (n° 118) , p. 93-100). (voltar)

 

(2) O Saara Ocidental é um território disputado pelo Marrocos cujo movimento separatista proclamou, em 1976, a República Árabe Saaraui Democrática (RASD), reconhecida por mais de 80 Estados e membro pleno da União Africana, apesar de não ser considerada pela ONU, que a avalia como “território não-autônomo”. (voltar)

 

-            Opening of the 25th Ordinary Session of the African Union Assembly of Heads of State and Government Johannesburg, South Africa,14 June 2015. 

Notas
Âncora 1
Âncora 2
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